"Westworld" simplifica narrativa e apresenta temporada mais fraca até aqui

Divulgação/HBO
As nuances dos personagens e enigmas das tramas de "Westworld" fizeram barulho desde o início e exigiram um espectador atento para montar o quebra-cabeça apresentado nos episódios. Isso foi intensificado no segundo ano da série, quando os roteiristas apostaram em uma instigante narrativa sem linha temporal definida, o que "explodiu a cabeça" de quem acompanha a produção da HBO. Já na terceira temporada, que terminou neste domingo (3), a proposta mudou muito, com os pontos de interrogação dando lugar a ações mais explícitas e objetivos mais claros, o que resultou na leva de episódios mais fraca até aqui.
O aguardado terceiro ano de "Westworld" começou apresentando os passos de Dolores (Evan Rachel Wood) na execução do plano de exterminar a raça humana. Agora vivendo no mundo real, depois de ter abandonado o parque temático da empresa Delos, a anfitriã do empreendimento se envolve em um mundo corporativo para aparentemente se vingar da violência física e do controle de narrativas aos quais ela foi submetida pelos humanos.
O alvo do plano de Dolores é Serac (Vincent Cassel), um empresário que tenta comprar o patrimônio da Delos para expandir os negócios. Ao lado do irmão, ele criou Rehoboam, uma inteligência artificial que utiliza dados sobre a vida das pessoas para fazer projeções sobre as trajetórias delas em busca do "melhor" dos destinos para a sociedade. Para isso, no entanto, a invenção tenta excluir e até "reprogramar" aqueles que podem ser considerados como ameaças para esse mundo ideal.
Boa parte do plano de Dolores envolve Caleb Nichols (Aaron Paul), um ex-soldado que, assim como o resto da população, tem a vida toda definida por Rehoboam. A anfitriã da Delos orienta Caleb em uma trajetória que culmina na divulgação de todas as narrativas programadas pela tecnologia de Serac e em uma revolta das pessoas contra esse sistema. Para frear as investidas da dupla, o empresário apela a Maeve (Thandie Newton), prometendo em troca o encontro com a filha que ela tanto busca.
No episódio final da temporada, enquanto o mundo registra vários conflitos por conta da revolta popular contra a empresa de Serac, Dolores e Caleb tentam acabar com Rehoboam, sempre seguidos de perto por Maeve. O ápice do confronto entre os personagens revela que, na verdade, Dolores não queria extinguir a humanidade, mas sim o mundo na forma como estava organizado. A anfitriã acreditava que, se os seres humanos estivessem livres da influência da inteligência artificial que orientava as vidas deles, isso significaria uma chance de as pessoas utilizarem verdadeiramente o livre arbítrio.
O desfecho também mostra que Caleb foi escolhido por Dolores para o plano pelo fato de já terem se encontrado antes, durante um treinamento no parque temático. A anfitriã tinha guardado na memória que o humano teve uma atitude correta ao defender as inteligências artificiais de abusos no empreendimento e, por isso, considerava que a habilidade de Caleb em fazer escolhas acertadas poderia ajudá-la. A revelação acaba deixando Maeve do lado da dupla na batalha contra Serac.
"Westworld" teve um terceiro ano muito desregular, marcado por escolhas criativas que enfraqueceram o vigor da história. A primeira delas foi a tentativa de simplificar a trama, talvez para que ela fosse mais acessível ao público. A série perdeu aquele ar misterioso e até filosófico que predominou nas duas primeiras temporadas, transformando-se em um produto mais genérico e menos interessante. A adoção de uma narrativa mais tradicional, sem a ousadia de mexer com a linha do tempo e a forma de mostrar os acontecimentos, também prejudicou a atração.
Divulgação/HBO
Com a terceira temporada concluída, ficou claro que alguns personagens foram conduzidos do nada a lugar nenhum. Bernard (Jeffrey Wright), por exemplo, passou os episódios perambulando por diversos cenários com o propósito de impedir os planos de Dolores, mas acabou limitado a um papel de figuração de luxo que serviu mais para deixar um gancho para o quarto ano da série do que para contribuir com o andamento da história atual. É possível dizer o mesmo de William/Homem de Preto (Ed Harris), muito mal aproveitado pelos roteiristas. Ambos os personagens ganharam cenas pós-créditos que indicam caminhos para o futuro, depois de terem a importância bastante diminuída.
Os conflitos entre Dolores e Maeve, colocadas em lados opostos em quase toda a temporada, também não foi bem conduzido. A rivalidade pareceu forçada para dar agilidade e preencher os episódios e nem mesmo a busca de Maeve pela filha conseguiu sustentar a trama. Faltou, quem sabe, ter construído uma base mais sólida para as diferenças entre as duas nas temporadas anteriores.
Nem só de problemas viveu "Westworld" na terceira temporada. A revelação de que Dolores tinha feito cópias de si mesma para executar o plano de acabar com o mundo rendeu bons momentos. A quebra de expectativa, uma vez que tudo levava a crer que a anfitriã tinha resgatado outros personagens do parque antes de fugir, foi uma ótima sacada. O conflito que isso gerou nos episódios finais, especialmente com a cópia que assumiu a personalidade de Charlotte Hale (Tessa Thompson), também foi um acerto, assim como a condução da história de Caleb, mesmo que a presença do ator em cena só tenha ganhado mais importância no final. Foram destaques, ainda, as sequências de ação e a ambientação futurística da trama.
"Westworld" perdeu muito ao abandonar uma narrativa mais arrojada para simplificar os acontecimentos. Nessa busca por uma trama mais "palatável", de fácil assimilação, a série ficou bem menos interessante, na comparação com as temporadas anteriores. Já renovada para o quarto ano, a produção precisa fortalecer a história e voltar a valorizar personagens para continuar relevante. Como os episódios costumam ser lançados a cada dois anos, tempo para isso não parece ser um problema.

WESTWORLD (terceira temporada)

ONDE: HBO e HBO GO (todos os episódios disponíveis)

COTAÇÃO: ★★ (regular)

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