Em tempo de atrações vazias, "Amor & Sexo" mostra que pode fazer mais do que entreter


Televisão é essencialmente entretenimento. Seus produtos, como novelas, reality shows e programas de auditório, são pensados para proporcionar diversão aos espectadores que se reúnem na sala. Mas, não precisa ser só isso. Conteúdo e mensagem, sob o pretexto de que não dão audiência, são itens raros, especialmente, nas grades de programação das emissoras de TV aberta. Na última quinta-feira (26), a estreia da nova temporada de "Amor & Sexo" reforçou que pode ser "um ponto fora da curva" e estabelecer discussões e diálogos interessantes com o público.
Já falei sobre o programa comandado por Fernanda Lima em outros textos por aqui e como acho importante que uma atração de TV aberta fale tão livremente sobre temas tão relevantes, mas que ainda são encarados como tabus. A atração já debateu, sem pudores ou preconceitos, sobre orgasmo, identidade de gênero, fetiches e mais uma dezena de assuntos semelhantes. Se não me falha a memória, porém, foi neste primeiro programa da nova temporada que "Amor & Sexo" assumiu um discurso mais incisivo e social.
"Amor & Sexo" decidiu falar sobre feminismo, indo, no entanto, muito além do debate relacionado a igualdade de oportunidades e salários. O programa se debruçou sobre assédio sexual e moral, alguns deles tão banalizados que muitos nem param para pensar que isso está relacionado a uma prática negativa e que subjuga o sexo feminino. Logo no início, a atração, utilizando recursos cênicos e música, discutiu os "simples" rótulos e julgamentos que a sociedade, como um todo, faz em relação às mulheres. 
Você já parou para pensar o que está por trás de xingamentos como "piranha", "piriguete", "vagabunda" e "puta"? Banalizados e usados, muitas vezes, como se fossem vírgulas, o emprego desses adjetivos foi debatido e provocou reflexão ao mais fundo e tentar mostrar que, por trás de uma "simples" palavra, pode estar arraigado um pensamento machista e retrógrado. Além disso, através de uma queima simbólica de sutiãs, a atração jogou na mesa importantes questões relacionadas a padrões de beleza, sexualidade e escolhas das mulheres.
A atração não se contentou só com isso e ainda abordou outras questões importantes, como a posição e as lutas das mulheres negras e homossexuais. Você acha que ainda existe nesse mundo a visão de que uma mulher negra só é um "passatempo" ou um "convite ao sexo"? Pois, você pode ter pensado que isso era uma questão superada, por conta do fim da escravidão e dos "sinhozinhos", mas, a julgar por relatos apresentados no programa, ainda é um comportamento desprezível que precisa ser combatido.
Para coroar tudo, "Amor & Sexo" fez uma homenagem a Elza Soares, uma das maiores vozes da música popular brasileira e, com certeza, do mundo. A presença da cantora continuou o debate sobre preconceito e empoderamento feminino, mas foi além ao lembrar a violência e as agressões sofridas por muitas mulheres. No fim, na voz da cantora, estava a dor de tantas e um grito de "basta" de todas.
Nunca me considerei nem um pouco machista e, mesmo assim, fui levado a muitas reflexões com a estreia da nova temporada de "Amor & Sexo", um programa que assumiu agora, mais do que nunca, um papel importante e mais amplo do que um simples entretenimento da programação noturna da televisão.

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