Humor afiado foi grande destaque de "Fina Estampa"

Será que um último capítulo de novela pode corresponder às expectativas de todos os telespectadores? É claro que não. Talvez por isso, as reclamações que li e ouvi sobre o final de "Fina Estampa", que foi ao ar nesta sexta-feira (23), sejam tantas. Quem esperava um final típico dos folhetins, com casamentos, vitória dos mocinhos e derrota dos vilões, ficou frustrado com o desfecho da saga de Pereirão e companhia.
O capítulo começa com Griselda (Lilia Cabral) amarrada em um galpão, pronta para ser executada por Tereza Cristina (Christiane Torloni) e Ferdinand (Carlos Machado). Enquanto o Pereirão espera pela morte, a madame leva seu comparsa para o motel e, ao melhor estilo Nazaré Tedesco, joga o secador de cabelo na banheira em que ele está: "cantou pra subir, bebê!".
Depois de despachar o cúmplice, Tereza Cristina retorna ao galpão e, se deliciando com o sofrimento da rival, bota fogo em tudo para que Pereirão morra queimada. No entanto, Griselda é salva pelo filho Antenor (Caio Castro) e por Patrícia (Adriana Birolli). A vilã consegue fugir, dribla a polícia e parte para uma viagem de barco com o amante, Pereirinha (José Mayer). Por conta de uma tempestade, os dois são engolidos pelo mar e dados como mortos. O desaparecimento da antagonista faz com que seu fiel escudeiro Crô (Marcelo Serrado) herde parte de sua fortuna. No fim, ainda, Griselda caminha tranquila pela Barra da Tijuca, quando se depara com Tereza Cristina, que passa dentro de um carro e debocha da cara dela.
O autor Aguinaldo Silva, ao escrever esse último capítulo, foi coerente com a trama que apresentou ao público. Desde o início, ele parecia não se levar à sério e querer contar uma história leve e, principalmente, com bom humor. Ele abusou da comédia e mostrou que o "sério" horário das 21 horas também possui espaço para o riso. Silva, em todos os seus trabalhos, consegue imprimir um humor afiado e inteligente, sem respeitar o chato politicamente correto.
As referências a trabalhos anteriores do autor foram hilárias. No fim da dupla Íris (Eva Wilma) e Alice (Thaís de Campos), elas decidem ir para Greenville, cidade fictícia da novela "A Indomada" e que tinha a vilã Altiva (também Eva Wilma) como sua moradora mais maligna. "Eu não disse que voltava", disse tia Íris ao olhar para a câmera e fazer alusão ao final de sua vilã na antiga trama. Ao jogar o mafioso que a ameaçava da escada, Tereza Cristina também disparou: "Obrigada, Nazaré Tedesco!", relembrando o esporte favorito da vilã criada por Silva para a novela "Senhora do Destino". Crô também citou outra trama do autor ao dizer que, tal qual o conteúdo da caixa de Perpétua (Joana Fomm), a vilã de "Tieta", ele também não ia revelar quem era seu amante secreto.
Outro bom destaque da novela foi o núcleo de Tereza Cristina, do qual faziam parte Crô, Baltazar (Alexandre Nero) e a empregada Marilda (Kátia Moraes). A vilã, como o próprio autor explicou em algumas entrevistas, era inspirada em desenho animado e, por isso, "podia qualquer coisa". Crô e Baltazar foram conquistando o público e eram presença indispensável em todos os capítulos. E a empregada "verticalmente prejudicada" contribuiu muito com o tom cômico do quarteto. Eva Wilma, Carolina Dieckmann, José Mayer, Júlia Lemmertz, Dan Stulbach, Guida Vianna e Ana Rosa também estiveram muito bem durante a novela. A taxista Vilma (Arlete Sales), o chef René (Dalton Vigh) e o núcleo da pousada, encabeçado por Álvaro (Wolf Maya) e Zambeze (Totia Meireles), não tiveram tramas bem desenvolvidas.
Mas, quero voltar ao último capítulo, porque nele há três cenas que quero destacar. A primeira é o discurso feito por Griselda, que foi escolhida paraninfa na formatura de Antenor. Falando sobre trabalho e ética, a personagem transmitiu tudo o que sua personagem representada e também explicitou o porquê de ter feito tanto sucesso. Depois, a cena final em que Griselva vê Tereza Cristina e descobre que Iemanjá não gostou e devolveu a "oferenda" que lhe foi dada. Mas, para mim, a grande cena do capítulo final foi a que Crô relembra o último momento que teve com a "Rainha do Nilo". Ali, pude confirmar um pensamento: Crô foi, durante toda a novela, o lado bom de Tereza Cristina. Ele era o "grilo falante" da vilã, a consciência que a impedia que cometer maldades ainda piores. No fundo, a cumplicidade dos dois fazia deles a mesma pessoa.
"Fina Estampa" não foi uma novela excepcional, mas cumpriu o papel de entreter e divertir o público com seu humor inteligente e ferino, seus personagens inspirados e sua trama sem qualquer compromisso com a realidade, resgatando, assim, um bela fase dos folhetins brasileiros.

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