"Tieta" chega ao Globoplay trazendo humor e mensagem sobre liberdade

Divulgação/TV Globo
Um carro dá voltas ao redor da praça de uma pequena cidade do Nordeste brasileiro. Ao som de Fafá de Belém, a câmera detalha as joias da motorista, indicando riqueza. Em seguida, a porta do veículo abre e quem desce é Tieta (Betty Faria), retornando à terra natal depois de 25 anos. Essa é apenas uma das sequências e símbolos marcantes de "Tieta", novela que passa a fazer parte do catálogo da plataforma de streaming Globoplay.
O folhetim, que foi ao ar pela primeira vez há mais de 30 anos, é considerado até hoje um dos maiores êxitos do gênero. Se alguém fizer um clipe com os principais momentos da televisão brasileira, é impossível que "Tieta" fique de fora, sendo muito provável que mais de uma cena ou personagem ganhe destaque.
O ponto de partida da novela é o romance "Tieta do Agreste", de Jorge Amado, mas um dos autores do folhetim, Aguinaldo Silva, já disse que muitas tramas tiveram que ser inventadas para sustentar uma novela de quase 200 capítulos. Com isso, ao lado de Ricardo Linhares e Ana Maria Moretzsohn, o novelista criou um universo de tipos curiosos e divertidos, que trazia, ainda, uma mensagem importante sobre liberdade.
Aproveitando a chegada da novela ao Globoplay, vale a pena relembrar algumas características importantes dessa história:

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- Liberdade x censura

Ainda jovem, vivida pela atriz Cláudia Ohana, Tieta é escorraçada de Santana do Agreste pelo pai, Zé Esteves (Sebastião Vasconcellos), que não aceita o espírito livre e as escolhas feitas pela filha. Em seguida, ele vai até um calendário e arranca a folha daquela data: 13 de dezembro de 1968. Zé Esteves ainda diz que faria de conta que aquele dia nunca existiu. Nem todos perceberam na época, mas a data em questão era a mesma da promulgação do Ato Institucional Número 5 (AI-5), que marcou a ditadura militar no Brasil. "Tieta" estreou pouco tempo depois de concluído o processo de redemocratização do país, por isso a referência à censura do período anterior. A novela, no entanto, foi além de uma citação histórica e falou sobre outros tipos de liberdade. A protagonista, expulsa e hostilizada pela mentalidade tacanha de Santana do Agreste, volta para enfrentar a censura das pessoas, exigindo respeito e confrontando preconceitos. Em determinado momento da história, Tonha (Yoná Magalhães), madrasta de Tieta, se liberta do machismo do marido e assume as rédeas da própria vida. Comprada pelo coronel Artur da Tapitanga (Ary Fontoura), a jovem Imaculada (Luciana Braga) usa a inteligência para evitar ser vítima de abusos sexuais. É mais um exemplo de personagem que carrega a mensagem de vitória da liberdade sobre aqueles que tentam limitá-la.

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- Perpétua e as beatas

A principal opositora à liberdade de Tieta é a amarga Perpétua (Joana Fomm), que atua como uma censora e diz representar a vigilância da moral e dos bons costumes em Santana do Agreste. Com um tom circense, na definição da própria intérprete, a antagonista carrega os preconceitos e a hipocrisia daqueles que se dedicam a julgar a vida alheia. Apesar de se dizer católica, Perpétua não aplica os ensinamentos da religião no dia a dia, alimentando sentimentos como ganância e inveja. A vilã tem diversos momentos cômicos ao lado das beatas Cinira (Rosane Gofman) e Amorzinho (Lília Cabral), que seguem o exemplo de Perpétua na hora de fazer julgamentos. Em nome das aparências, a dupla tenta conter algumas sensações, especialmente aquelas provocadas pelo sexo oposto.

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- Humor

Mesmo tendo alguns momentos dramáticos, a base da narrativa de "Tieta" é o humor, usado, inclusive, quando os autores queriam expor ou criticar alguns temas. Além do núcleo das beatas, o texto cômico aparece, ainda, nas histórias que rondam os personagens Osnar (José Mayer), Timóteo (Paulo Betti) e Amintas (Roberto Bonfim). O mendigo Bafo de Bode (Bemvindo Sequeira) tem a função de usar a comédia para dizer verdades aos moradores de Santana do Agreste, sempre com a desculpa de estar sob a influência do álcool. As escapadas de Modesto Pires (Armando Bogus) para visitar a amante Carol (Luiza Tomé), sua "teúda e manteúda", também rendem bons momentos.

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- Elenco

Rever "Tieta" é uma ótima oportunidade para acompanhar bons trabalhos de atores que já morreram, como Armando Bogus (sempre ótimo), Míriam Pires, Elias Gleizer, Cláudio Corrêa e Castro, Renato Consorte, Sebastião Vasconcellos e Yoná Magalhães. Vale destacar, também, as interpretações de Arlete Salles como Carmosina; Luciana Braga; Betty Faria; Cássio Gabus Mendes; e Joana Fomm. Paulo José, em uma participação especial, é outro bom nome do elenco.



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- Universo fantástico e compartilhado

Aguinaldo Silva já tinha escrito "Roque Santeiro" ao lado de Dias Gomes, mas foi em "Tieta" que o autor começou de fato a desenhar o universo de realismo fantástico que criaria na televisão. Nesse trabalho, ao lado de Ricardo Linhares e Ana Maria Moretzsohn, o novelista colocou elementos que seriam mais desenvolvidos depois, como os poderes afrodisíacos da Lua. Santana do Agreste era uma cidade isolada e parada no tempo e, no final, foi completamente soterrada por areia. Mesmo desaparecendo, a cidade fictícia acabou indo parar em um mapa que interliga todas as tramas de realismo fantástico escritas por Silva.

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