"Sete Vidas" contraria novelas tradicionais e coloca beleza do cotidiano em evidência

Divulgação/TV Globo
Há quem diga que uma novela não dá certo se não trouxer alguns elementos básicos, como um casal apaixonado que sofre meses de idas e vindas para ficar junto, um vilão marcante e responsável pela maior parte das "viradas da história" ou, até mesmo, cenas rápidas que dão agilidade à narrativa. Quem acompanhou a novela "Sete Vidas", de Lícia Manzo, nos últimos meses, percebeu que qualquer "fórmula" conceituada para estruturar um folhetim televisivo "caiu por terra". Com uma trama naturalista, que focou em conflitos do cotidiano e personagens distantes de qualquer estereótipo, a autora fugiu do habitual e presenteou o público com uma bela obra audiovisual.
"Sete Vidas" trouxe a história de Miguel (Domingos Montagner), um homem atormentado por traumas do passado e que nunca conseguiu estabelecer uma vida sólida. Vivendo um relacionamento conturbado com Lígia (Débora Bloch), ele decide largar tudo para se aventurar em uma viagem pela Antártida, onde sofre um acidente com seu barco e é dado como morto. 
Nesse meio tempo, a jovem Júlia (Isabelle Drummond) descobre ser fruto de uma inseminação artificial, cujo doador foi Miguel. Ela, então, decide procurar outros possíveis irmãos e acaba se deparando com Pedro (Jayme Matarazzo). Sem saberem do laço que os une, no primeiro momento, eles se apaixonam, mas logo descobrem que são filhos gerados pela mesmo doador de sêmen. A situação deles muda quando Júlia descobre que não é filha de Miguel e que tudo não passou de uma mentira sustentada pela mãe, Marta (Gisele Froes). 
Para completar essa família diferente, Júlia e Pedro passam a conviver com os outros filhos gerados pela doação de Miguel. A trama passa, então, a retratar o cotidiano de Laila (Maria Eduarda de Carvalho), Bernardo (Guilherme Lobo), Luís (Thiago Rodrigues) e Felipe (Michel Noher). Para completar, Lígia também descobre que está grávida de Joaquim, o sétimo filho do protagonista, que volta à história e passa a encarar a nova realidade que se apresenta. 
O último capítulo, exibido nesta sexta-feira (10), trouxe os desfechos das relações entre Lígia e Miguel, e Júlia e Pedro. Além disso, os irmãos, depois de terem seus conflitos resolvidos na história, partem em uma viagem de barco. 
A primeira qualidade que posso destacar de "Sete Vidas" é o texto excepcional de Lícia Manzo e seus colaboradores. Mostrando preocupação em construir diálogos de qualidade e de fôlego, os autores nadaram contra a corrente e apostaram certo em cenas longas, sustentadas pelo rico roteiro proposto ao público. 
Divulgação/TV Globo
Inspiradora, também, a escolha de Lícia por criar uma novela "naturalista", onde os conflitos do cotidiano dão a tônica de todas as relações entre os personagens. Temas como inseminação artificial, doação, maternidade, carreira, vício, separação, homossexualidade e amizade foram retratados na trama. A empreitada consagra, de vez, a autora como uma cronista do dia a dia. Suas "simples" cenas de café da manhã foram capazes de ir além do que se esperava e provocaram reflexões e bons momentos para a história.
Outra marca importante do folhetim das seis foram os personagens, todos, sem exceção, extremamente bem construídos e complexos. Os problemas de Miguel e Lígia, por exemplo, não ficaram restritos aos desencontros típicos de casais de novelas e foram provocados por traumas e sentimentos de ambos. Esther (Regina Duarte) foi outro personagem muito rico do universo da autora, que criou uma mulher de espírito livre, que havia sido casada com outra e que pregava uma vida que fosse além de qualquer rótulo. Os conflitos pessoais e profissionais de Irene (Malu Galli) e o casamento de Lauro (Leonardo Medeiros) e Isabel (Mariana Lima) foram outros destaques.
Ressaltando a beleza do cotidiano, "Sete Vidas" não trouxe nenhum vilão maquiavélico, nem um casal "água com açúcar" e, muito menos, uma trama cheia de recursos dramatúrgicos criados para prender a atenção do espectador. A novela de Lícia Manzo foi além e apostou na sensibilidade do público para mostrar que a vida é muito mais do que os conceitos de certo ou errado, bom ou mau, bonito ou feio e que as histórias podem ultrapassar todos os chavões ou maniqueísmos explorados pela televisão. O folhetim deixa, com seu fim, uma valorosa lição: que a vida, e só ela, se encarrega de tudo...

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