Após meses de vingança, "Avenida Brasil" termina falando de perdão

Foram sete meses e 178 capítulos de vingança. Lá no início, Rita (Mel Maia) é abandonada no lixão pela madrasta Carminha (Adriana Esteves) após a morte do pai, Genésio (Tony Ramos). A menina é adotada por uma família e se muda para a Argentina. Anos depois, decide voltar ao Brasil para destruir a vida de Carminha e, assim, fazer justiça com as próprias mãos. No capítulo final de "Avenida Brasil", exibido nesta sexta-feira (19), a trama encerrou sua trajetória exibindo um desfecho oposto ao sentimento que moveu a novela: o perdão.
Após o sequestro de Tufão (Murilo Benício), Santiago (Juca de Oliveira) colocou a vida do jogador nas mãos de Carminha, que preferiu impedir os planos do pai, salvando, assim, o ex-marido e Nina/Rita (Débora Falabella). Já entregue à polícia, Carminha confessa que matou o amante Max (Marcelo Novaes), salvando a protagonista novamente, já que a mesma estava em poder de Max na hora do crime. A confissão também inocentou Lucinda (Vera Holtz), que havia assumido a culpa pelo assassinato por achar ter feito mal a Carminha no passado e por acreditar que a vilã teve uma atitude nobre salvando Nina.
Depois de passar alguns anos presa, Carminha sai da cadeia e vai morar no lixão com Lucinda. Lá, a vilã leva uma vida igual a que tinha na infância, mas diferente da que gostaria de ter. Esse é o castigo da personagem. Então, Nina e Jorginho (Cauã Reymond) decidem apresentar o filho deles para a avó e, assim, buscar o perdão uns aos outros.
No Divino, o trígamo Cadinho (Alexandre Borges) recebe suas três mulheres de volta e todos se casam em uma cerimônia realizada na sede do clube de futebol do bairro. Em futebol, aliás, é que termina o último capítulo. Depois de superar um trauma e parar de usar chupeta, Adauto (Juliano Cazarré) faz o gol que leva o Divino Futebol Clube para a primeira divisão do Campeonato Carioca.
A vingança de Nina e o desejo de fazer justiça foram os fios condutores de "Avenida Brasil". Durante a história, vimos Carminha fazer maldades e Nina arquitetando planos para prejudicar a vilã. Num dado momento, o jogo se inverteu e a mocinha teve Carminha nas mãos, fazendo com que a rival passasse por todo tipo de humilhação.
Mas, então, por que terminar com perdão? O autor, João Emanuel Carneiro, quis encerrar o ciclo da novela com um sentimento que ninguém esperava que as duas pudessem sentir uma pela outra. Adepta de "os fins justificam os meios" em boa parte da trama, Nina viu que o "monstro" que a jogou no lixão não era só mau, da mesma forma que Carminha viu que a "peste" que atrapalhava seus planos podia ter outro lado.
Em "Avenida Brasil", a mocinha e a vilã não podiam ser assim denominadas. Carminha e Nina eram personagens dúbias, alternando momentos de bondade e maldade.
Carminha era capaz de cometer os piores crimes, porém demonstrava um amor incondicional pelo filho Jorginho. Nina carregava as principais características das mocinhas dos folhetins, mas também foi cruel e egoísta ao executar sua vingança contra a madrasta que a abandonou no lixão.
Não havia inocentes em "Avenida Brasil". O perdão final não foi apenas para Carminha, mas também para Nina. Na cena do abraço, o autor pareceu mostrar que as duas tinham tomado ciência dos comportamentos que tiveram.
Não vejo o final de Carminha como uma redenção. Ter tomado aquelas atitudes em favor de Nina e Tufão foi apenas um passo para que ela pudesse começar uma nova vida, mas não a redimiu de todo o mal que fez durante a trama. O castigo, por tudo isso, ela recebeu: foi para a cadeia e esteve condenada ao lixão em que cresceu e à vida que ela mais detestava.
A dubiedade da personagem também me deixou uma dúvida: Carminha escolheu fazer o bem ou apenas optou por fazer o mal para outra pessoa? Ao salvar Nina e Tufão, ela não estava necessariamente fazendo o bem, mas, talvez, estivesse apenas optando por prejudicar Santiago, o pai que tanto a maltratou na infância. Matando Max, ela não estava só salvando a protagonista, mas também descartando a peça de um jogo que ela não queria mais jogar.
Carminha também não recebeu o perdão de todos no fim. E, muito menos, mostrou se arrepender de algumas atitudes como, por exemplo, rejeitar a filha Ágata (Ana Karolina). Mesmo no lixão e depois de tudo, ela continuou a Carmem Lúcia amarga e sarcástica de sempre. Por isso, Carminha não teve uma redenção no fim de "Avenida Brasil" e nem ficou boazinha, apenas sinalizou que poderia seguir um caminho diferente a partir daquilo. Mas, quem garante?
Particularmente, achei muito bom o final de "Avenida Brasil". Ao contrário do que muitos estão dizendo, Carneiro fugiu do óbvio ao provocar o perdão entre Nina e Carminha. Talvez não tenha sido surpresa, já que algumas revistas e sites descobriram e divulgaram o desfecho. Mas, aí a culpa já não é do autor.
Toda a novela, aliás, foi excepcional. A história foi ágil e muito bem escrita, reservando momentos marcantes para os atores e personagens. Houve alguns escorregões, como o fato de Nina nunca ter salvo as fotos que tinha contra Carminha em um pendrive ou computador, mas nada disso conseguiu tirar os méritos de "Avenida Brasil".
Os personagens criados por Carneiro e o trabalho dos atores envolvidos também são atípicos na televisão. Por conta da demanda do gênero, geralmente, os personagens são "rasos" e não apresentam muitas nuances. Aqui, os intérpretes souberam atribuir profundidade à personalidade dos seus personagens. E isso fez muita diferença.
A qualidade do trabalho técnico também chamou atenção. "Avenida Brasil" era cinema diariamente, por conta dos cenários e da narrativa que a direção aplicou à história. As câmeras "nervosas" deixaram a novela rápida e as cenas da família Tufão reunida à mesa imprimiram um tom naturalista aos diálogos.
"Avenida Brasil" sai do ar como a melhor novela exibida nos últimos 15 anos, no mínimo. A construção da trama mobilizou o público e fez lembrar os tempos dos novelões, quando todos esperavam para descobrir quem matou Odete Roitman ou quem era "A Próxima Vítima" de um misterioso serial killer. A história de Nina, Carminha e companhia mostrou que a televisão ainda pode proporcionar bons momentos para o telespectador. É isso, fim. Oi oi oi.

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