Teledramaturgia 60: os clichês

Nesses 60 anos de teledramaturgia no Brasil, não faltaram clichês para se contar uma história. Há quem diga que as novelas andam necessariamente de mãos dadas com os clichês e essas pessoas não estão totalmente erradas. Algumas tramas são repetidas constantemente nas produções de dramaturgia na TV.
Pessoalmente, não me incomodo com os clichês, desde que eles sejam bem executados dentro da trama. Talvez esse seja o segredo dos clichês, eles só incomodam quando as histórias não são bem conduzidas ou quando os personagens não tem carisma. Do contrário, bem realizados, eles arrebatam o público e chamam atenção positivamente. Vamos relembrar alguns desses clichês recorrentes na teledramaturgia brasileira:

- O amor proibido: Os casais da teledramaturgia sempre precisam enfrentar inúmeros obstáculos até conseguirem ficar juntos. Para muitos deles, o primeiro desafio é superar as proibições que possam existir para o romance acontecer. Foi assim com Jade (Giovanna Antonelli) e Lucas (Murilo Benício) de "O Clone", que precisaram transpor as diferenças culturais e religiosas para ficarem juntos.
Se Romeu e Julieta não podiam ficar juntos pela disputa entre suas famílias, o mesmo aconteceu com Giovanna (Letícia Spiller) e Enrico (Leonardo Brício), na primeira fase de "O Rei do Gado". As famílias rivais dos Berdinazzi e dos Mezenga não conseguiam aceitar o envolvimento dos dois, fato este que também se repetiu na segunda fase da novela com Luana/Marieta Berdinazzi (Patrícia Pillar) e Bruno Mezenga (Antônio Fagundes).
E, às vezes, o que pode atrapalhar o amor de um casal de novela é a religião. Os votos e a batina do padre Miguel (Murilo Rosa) impediam que ele se envolvesse com Laura (Fernanda Vasconcellos) em "Desejo Proibido". Enfim, motivos não faltam para separar os casais da ficção. Mas, uma boa trama de amor proibido é um clichê que costuma funcionar. Culpem Shakespeare por isso.

- O amor de outras vidas: Alguns casais têm tanta afinidade que passam a dizer que são almas gêmeas e que o amor estava escrito. Na ficção, alguns amores são, comprovadamente, de outras vidas, como o de Rafael (Eduardo Moscovis) e Serena (Priscila Fantin), que era a reencarnação de Luna (Liliana Castro), a primeira esposa dele em "Alma Gêmea". Na verdade, as almas do casal já tinham se encontrado muitas outras vezes, antes que pudessem ficar juntas. Diná (Christiane Torloni) e Otávio (Antônio Fagundes) também se conheciam de outras vidas em "A Viagem", mas o amor deles sofria a interferência de Alexandre (Guilherme Fontes) que, durante várias vidas, perseguiu o casal. Alguns casais também acham que o amor deles estava "Escrito Nas Estrelas", como Ricardo (Humberto Martins) e Viviane (Nathália Dill), que lutaram por muitas vidas para ficar juntos.

- Cara de um, fucinho de outro: Se um mocinho de novela é cheio de virtudes, quem melhor para se opor a ele do que ele mesmo, em sua versão antagônica? Usar gêmeos como personagens marcantes na teledramaturgia já virou rotina. As gêmeas Ruth e Raquel (Glória Pires), de "Mulheres de Areia", talvez sejam as mais conhecidas da TV. E, claro, para aumentar o conflito entre as duas, elas se interessam por Marcos (Guilherme Fontes) e está dada a história. Lucas e Diogo (Murilo Benício) até que eram amigos em "O Clone", mas se estranhavam de vez em quando. Tudo piorou após Diogo morrer e Lucas descobrir a existência de Léo, sua "cópia perfeita". Jorge e Miguel (Mateus Solano), de "Viver a Vida" só se entenderam mesmo no último capítulo, mas, antes disso, os irmãos viviam em pé de guerra e disputaram o amor de Luciana (Alinne Moraes). Já Paula (Alessandra Negrini), de "Paraíso Tropical", sonhava em encontrar Taís, sua irmã gêmea, mas acabou encontrando uma rival daquelas.

- Conflitos entre mães e filhos: Se a rivalidade entre irmãos gêmeos rende muito material para as novelas, os conflitos entre mães e seus rebentos também são temas recorrentes na teledramaturgia brasileira. Atualmente, as três produções no ar na TV Globo trazem essa temática em suas novelas. Em "A Vida da Gente", Eva (Ana Beatriz Nogueira) inferniza a vida das filhas, Ana (Fernanda Vasconcellos) e Manuela (Marjorie Estiano). Maruscka (Marília Pêra) faz de tudo para atrapalhar o casamento do filho Rubinho (Victor Peccorato) com Cláudia (Giovanna Antonelli) em "Aquele Beijo". Já na novela das 21 horas, "Fina Estampa", Patrícia (Adriana Birolli) não suporta os ataques de sua mãe, Tereza Cristina (Christiane Torloni). E, para ninguém dizer que isso é coisa de agora, em "Laços de Família", Camila (Carolina Dieckmann) e Helena (Vera Fisher) disputaram o amor do mocinho, Edu (Reynaldo Gianechinni). E, mais lá para trás, Raquel (Regina Duarte) vivia aos berros com a filha mau-caráter, Maria de Fátima (Glória Pires), de "Vale Tudo".

- A pergunta que não quer calar: Vez ou outra por aí, um personagem é assassinado e uma pergunta vem à tona: quem matou? A vilã-mor de "Vale Tudo", Odete Roitmann (Beatriz Segall) foi morta por três tiros, mas a identidade da assassina só foi revelada no último capítulo. Algum tempo depois, o empresário Lineu Vasconcelos (Hugo Carvana) também apareceu morto em seu escritório e muitos eram os suspeitos do crime em "Celebridade". Taís (Alessandra Negrini), de "Paraíso Tropical"; Henrique Sobral (Reginaldo Faria), de "Força De Um Desejo"; e Norma (Glória Pires), de "Insensato Coração" também tiveram mistérios envolvidos em seus assassinatos. Todos esses crimes, no entanto, tinham algo em comum: todos foram arquitetados pelo autor Gilberto Braga. Sílvio de Abreu foi além e escreveu "A Próxima Vítima", novela toda centrada em uma série de assassinatos misteriosos. Alguns anos depois, o autor escreveu um novo mistério e o público se perguntou: Quem matou Saulo (Werner Schünemann), o vilão da novela "Passione"?

- "Eu sou o presidente": Algumas produções da teledramaturgia não abrem mão de terem em suas tramas as disputas pelo poder. Os personagens passam a novela toda brigando pela presidência de empresas. Dentre elas, talvez a loja Luxus, de "Cobras & Lagartos", tenham sido a que mais mudou de mãos. Depois da morte do dono da empresa, Omar Pasquim (Francisco Cuoco), a loja passou pelas mãos de Foguinho (Lázaro Ramos), Ellen (Taís Araújo), Estevão (Henri Castelli) e Leona (Carolina Dieckmann). Alta rotatividade na cadeira de presidente da Luxus. A vilã Bia Falcão (Fernanda Montenegro), sempre questionava as ordens de Júlia (Glória Pires), sua neta e presidente da empresa de lingeries que dava nome à novela "Belíssima". Flora (Patrícia Pillar), a psicopata de "A Favorita", também almejava o cargo de presidente na empresa de Gonçalo Fontini (Mauro Mendonça). O desejo de ocupar o mais alto cargo de uma empresa também motivou as maldades de Olavo (Wagner Moura), de "Paraíso Tropical". Enfim, muita gente querendo ser presidente.

Em tempo: As mesas de reuniões das empresas da ficção sempre vivem cheias de acionistas e diretores que sequer têm uma fala, só vivem balançando a cabeça.

Poderia passar o dia por aqui, enumerando outras tramas que aparecem com uma certa frequência na nossa TV, afinal, são 60 anos de produções. Alguns dizem que a teledramaturgia vive de contar as mesmas histórias. Mas, pelo menos para mim, o que importa é a maneira como esses clichês são contados. Muitos deles são bem eficientes, afinal, é muito difícil encontrar alguém que não tenha resistido a um bom clichê.

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