"Cordel Encantado": conto de fadas arretado


Era uma vez um reino dividido pela disputa entre os reis Augusto e Teobaldo. Depois de uma guerra que vitimou o rei Teobaldo, Augusto e sua mulher, a rainha Cristina, decidiram selar a paz propondo um acordo: quando seus respectivos filhos completassem a maioridade, deveriam casar e juntos comandar o reino de Seráfia unificado. Teobaldo morre e Augusto se torna o único rei de Seráfia, prometendo entregar sua filha Aurora para se casar com Felipe, filho do rei Teobaldo e da rainha Helena.
Depois de ser avisado sobre um tesouro que seus antepassados tinham enterrado no sertão do Brasil, o rei Augusto parte com toda a sua corte para o local, com o propósito de encontrar essa fortuna. Quando recuperam o tesouro, são atacados por um bando de cangaceiros. Aproveitando a oportunidade, a duquesa Úrsula, cunhada de Augusto, decide matar a rainha Cristina e a princesa Aurora, colocando a culpa nos cangaceiros para que, assim, pudesse ter alguma chance de conquistar o trono de Seráfia. Fugindo da duquesa e de seu mordomo Nicolau, a rainha entrega sua filha para uma sertaneja, para que fique em segurança. Eles voltam a capturá-la e provocam a morte de Cristina, que cai de um penhasco.
A princesa, então desaparecida, e a rainha são dadas como mortas e o tesouro acaba sumindo. Capitão Herculano, chefe dos cangaceiros que atacaram a corte de Augusto, encontra a rainha Cristina que lhe faz um pedido antes de morrer: ele deveria procurar Augusto e dizer que a princesa estava viva e foi entregue a uma família de sertanejos. Para provar que o que estava dizendo era verdade, Herculano tira uma correntinha do pescoço da rainha e, depois, enterra o corpo.
Vinte anos depois, o rei Augusto aprova que Carlota, filha da duquesa Úrsula, se case com o príncipe Felipe e cumpra o acordo de paz no lugar de sua filha falecida. No entanto, no dia do casamento, o rei é avisado que sua filha está viva e morando no sertão do Brasil. Com a notícia, Augusto e sua corte partem novamente para o local em busca da princesa perdida.
A trama de "Cordel Encantado", novela das 18 horas da TV Globo, bem que parece um conto de fadas daqueles que as mães contam para os filhos antes de dormir. E isso não é mera coincidência. O folhetim bebe da fonte das histórias infantis para contar o drama do rei Augusto (Carmo Dalla Vecchia), que teve sua filha Aurora dada como morta depois que a rainha Cristina (Aline Moraes) entregou a criança para ser criada por Virtuosa (Ana Cecília Costa) e Euzébio (Enrique Diaz), livrando-a das maldades de Úrsula (Deborah Bloch) e Nicolau (Luiz Fernando Guimarães).
As referências tiradas dos contos de fadas são várias, a começar pelo nome da princesa, homônima da Bela Adormecida. Não por acaso, a vilã Úrsula recebeu este nome graças à bruxa de "A Pequena Sereia". A vilã, inclusive, utiliza um artifício que parece ser tirado de alguma história infantil: quando quer descobrir algum segredo, ela faz com que sua vítima tome o soro da verdade e saia confessando tudo. Adoecer de amor também parece coisa de conto de fadas e isso aconteceu em "Cordel". Aqui, Antônia (Luiza Valdetaro) adoece depois de ser proibida por seu pai, o coronel Januário Cabral (Reginaldo Faria), de se casar com o infante Dom Inácio (Maurício Destri), irmão do príncipe Felipe (Jayme Matarazzo). O amor era tão grande que Dom Inácio também adoeceu. Uma cozinheira que se apaixona por um rei, te lembra alguma coisa? Maria Cesária (Lucy Ramos) faz as vezes de Gata Borralheira ao se apaixonar por Augusto, o rei de Seráfia. Seus dotes culinários também são mágicos: ela consegue transmitir, para o prato que está fazendo, os sentimentos que está sentindo naquele momento. Pura fantasia.
O texto de "Cordel Encantado" é um dos ganhos da novela. Além de usarem as referências das histórias infantis, que dão uma atmosfera lúdica à trama, as autoras Duca Rachid e Thelma Guedes também apostaram num texto ágil e sem enrolação. Mistério que poderia ter sido levado por muitos meses na trama, a identidade da princesa perdida no sertão foi revelada no primeiro mês da novela. Agora, o folhetim se desenrola em cima da adaptação de Açucena (Bianca Bin), que precisa se acostumar à nova vida depois de descobrir que é filha do rei Augusto e a princesa perdida.
O humor é o ponto alto de "Cordel" e fica por conta de personagens como o prefeito Patácio (Marcos Caruso) e Dona Ternurinha (Zezé Polessa), que ficam cheios de rapapés para a corte de Seráfia. O núcleo composto pelo delegado Batoré (Osmar Prado), Neuza (Heloísa Perissé) e Farid (Mouhamed Harfouch) também diverte. Os comentários do mordomo Nicolau e os lapsos de memória da rainha-mãe Efigênia (Berta Loran) merecem destaque.
O núcleo dos cangaceiros dá uma abrasileirada na trama. Herculano (Domingos Montagner), o rei do cangaço, é claramente inspirado em Lampião. O núcleo ainda conta com as ótimas participações de Tuca Andrada, João Miguel e Ilva Niño. Matheus Nachtergaele, interpretando o profeta Miguézim, também está bem e confirma seu talento para fazer personagens excêntricos.
A qualidade técnica de "Cordel Encantado" faz toda a diferença. Iluminação, figurino e fotografia  estão acima das média em relação a outras produções. A imagem, um show à parte, dá uma aparência de cinema para a novela.
Por todas essas características apresentadas, só me resta dizer que "Cordel Encantado" é a melhor novela no ar atualmente e uma das melhores dos últimos anos. Enquanto outras produções buscam inspiração na vida real para contar suas histórias, "Cordel" se inspira no faz de conta e estimula a fantasia com uma trama lúdica e bem-humorada. O resultado: um conto de fadas arretado, que mistura a beleza da realeza europeia com a aridez do sertão nordestino. Haja imaginação.

CORDEL ENCANTADO

QUANDO: de segunda a sábado

ONDE: TV Globo

HORÁRIO: 18h25

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