Trinta anos de aviõezinhos, Chaves e programação desregular

"Agora é hora de alegria, vamos sorrir e cantar, do mundo não se leva nada, vamos sorrir e cantar". É só essa música começar a tocar, para estarmos avisados: Sílvio Santos vem aí. Na sexta-feira (19), o SBT comemorou 30 anos no ar e, durante o mês de agosto, está exibindo uma série de programas comemorativos.
Para iniciar as comemorações do aniversário, o SBT já exibia há alguns meses o especial "Festival SBT 30 anos", um programa que funcionava como uma espécie de túnel do tempo e revisitava atrações e antigas personalidades que passaram pela emissora. Comandado por Patrícia Abravanel, o "Festival" foi um acerto e se mostrou um programa de qualidade, com bons depoimentos e edição caprichada. E, também, quem é que não gosta de relembrar programas do passado?
Uma edição especial do programa "Qual É O Seu Talento?" também foi exibida como forma de homenagear a emissora trintona. Artistas da casa mostraram outras facetas talentosas (ou não), cantando, dançando ou tocando algum instrumento. Sem graça, o programa foi tedioso e não funcionou. No dia do aniversário, duas atrações homenagearam o "coringa" do SBT, aquele que pode ser colocado em qualquer horário da programação e terá um público cativo: o "Chaves". Ratinho exibiu em seu programa uma entrevista com o ator Roberto Bolaños, que deu vida ao personagem que mora em um barril, e Florinda Meza, a intérprete da Dona Florinda. Entendo que a emissora tenha guardado a entrevista para exibi-la no dia do aniversário de 30 anos, mas isso foi gastar cartucho à toa, já que, na sexta-feira, todas as atenções estavam voltadas para o último capítulo de "Insensato Coração", na Globo. Mas, em todo caso, valeu pela ideia de homenagear o programa mais popular do SBT. Após a entrevista, alguns nomes do elenco da emissora se reuniram para encenar e "homenagear" o "Chaves". O especial, no entanto, só conseguia causar vergonha. Mesmo utilizando algumas piadas que funcionam no programa do Chaves, os participantes do especial não tinham o "timing" da comédia necessário para fazer jus às piadas.
Nesses 30 anos, muitos programas e artistas marcaram a emissora. Serginho Groissman ensaiou com seu "Programa Livre", o que hoje faz muito bem na Globo. Golias me deixava sem ar com suas piadas e seu jeito debochado, que fazia rir com seu humor dúbio e único. O sofá da Hebe ficou famoso ali e permitiu que a apresentadora ganhasse o estigma de "A cara do SBT". Mas, parece que os bons tempos do SBT já passaram.
A programação da emissora atual é, no geral, ruim. Programas como "Quem Convence Ganha Mais", "Esquadrão do Amor" e "Casos de Família"  trazem barracos e buscas por relacionamentos para a TV, fórmulas batidas e que não são estão sendo bem executadas. A figura falante e precoce da menina Maísa já ficou cansativa e a insistência em deixá-la vestida de Shirley Temple parece ridícula. "A Praça é Nossa", que outrora teve a presença de grandes humoristas, hoje fica restrita ao talento de três ou quatro nomes. 
Os acertos na programação são esporádicos. "Qual É O Seu Talento?" diverte nas noites de segunda-feira; o "Esquadrão da Moda" se mostrou um reality interessante; e estar "De Frente com Gabi" aos domingos é uma excelente maneira de encerrar a noite. Algumas coisas não mudam: o "Chaves" continua por lá e ainda faz sucesso, deixando alguns programas da concorrência para trás. 
O dono do SBT continua sendo a grande atração de seu canal. Agora com um ar mais desavergonhado, Sílvio Santos mostra-se à vontade para falar com suas "colegas de trabalho", numa desenvoltura que poucos apresentadores têm na televisão. Seu hábito de jogar aviõezinhos de dinheiro para a plateia me causa estranhamento até hoje, mas é inegável que ele é um dos maiores apresentadores que temos.
O SBT parece ter parado com suas habituais mudanças de horários. "Televisão é hábito", já disse alguém com toda razão. Como o espectador vai se acostumar a assistir um programa se, na semana seguinte, ele já está passando em outro dia e horário? Não há atração que resista.
Quanto às novelas, Sílvio Santos parece ter entendido que o gênero é muito popular no Brasil e pode representar um bom faturamento para a emissora quando bem sucedido. No entanto, se o canal se propõe a fazer novelas, que, pelo menos, trate o produto com mais atenção. Depois da exibição de muitos textos mexicanos, o SBT está investindo em tramas originais. "Uma Rosa Com Amor" e "Amor e Revolução" foram duas tentativas importantes para consolidar um público de novelas. Porém, "Amor e Revolução" não funcionou como o esperado e está longe de chegar ao patamar da audiência que dava "Uma Rosa Com Amor", que chegava muitas vezes aos dois dígitos. Um erro na produção das novelas do SBT é gravar as tramas de uma vez e não esperar pela resposta do público. Novela é uma obra aberta e deve caminhar de acordo com a resposta da audiência. "Amor e Revolução", por exemplo, só termina em novembro no ar, mas as gravações se encerram no final de agosto. Não dá.
No jornalismo, a emissora ainda não acertou o tom de seus noticiários. Querendo seguir uma linha mais descontraída, da qual eu sou extremamente favorável, o SBT escorrega e, muitas vezes, fica descontraído demais, parecendo programa de variedades da tarde. Com o tempo, não duvido, estas arestas podem ser aparadas e podem surgir produtos jornalísticos interessantes. Um grande e bom produto jornalístico faz falta à programação da emissora.
A história de uma televisão é feita de acertos e erros, e a do SBT não é diferente. Sua programação, em especial a de antigamente, já marcou a vida de muita gente. A emissora tem, hoje, uma cara mesclada: metade é nova, tentando pensar e se adequar ao gosto do novo público; e a outra metade é retrô, para agradar um público mais cativo da emissora que busca esse lado. E, tudo indica, essa cara mesclada ainda vai durar muito tempo, afinal, seria esquisito ligar a televisão e não ver aviõezinhos voando pelo auditório ou o Chaves aprontando na vila do Seu Barriga. Como já disse em alguma linha desse texto, algumas coisas não mudam nunca. Quem quer dinheiro?

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