Seis escolhas difíceis de engolir no roteiro da última temporada de "Game of Thrones"


Ao longo dessa última temporada, "Game of Thrones" tem conseguido mobilizar o público, semana após semana, com os desfechos reservados para os personagens de Westeros. Para o bem e para o mal! Até o penúltimo episódio, exibido no domingo (12), a série se beneficiou da curiosidade dos fãs, que se mantiveram fiéis ao longo dos anos, mas também gerou muitas críticas sobre a condução da história para o aguardado final.
Considerando tudo que já foi visto até aqui, entendo que o principal problema, que alimenta a insatisfação de muitos com as escolhas do roteiro, está no ritmo que a história vem apresentando. Até o sexto ano, "Game of Thrones" impôs ao espectador uma narrativa mais lenta, que privilegiava um texto mais elaborado e construções coerentes dos arcos dos personagens. Não havia necessidade de pressa, todos os caminhos para o embate derradeiro entre as famílias de Westeros estava sendo desenhado com paciência e estratégia.
Quando houve a decisão de encerrar a série na oitava temporada, os roteiristas realizaram uma drástica mudança de ritmo narrativo, que começou a ser vista no início do sétimo ano. Naquele momento, distâncias não importavam mais e o crescimento dos personagens tinha chegado ao ápice, direcionando-os para desfechos pretendidos. Ali, a rapidez com que as coisas começaram a acontecer ainda não influenciava no resultado final, mas, agora, isso aconteceu.
Faltando apenas um episódio para o ponto final na saga baseada nos livros de George R.R. Martin, já dá para dizer que "Game of Thrones" teve pressa demais em concluir os destinos dos personagens, alguns deles severamente comprometidos por conta das escolhas do roteiro ansioso e, por vezes, incoerente. A mudança de ritmo tem efeito claro sobre a área criativa, que é vítima do tempo curto e da grande quantidade de arestas que precisam ser aparadas. Sinto dizer, mas algumas não serão. As mães sempre nos alertam: a pressa é inimiga da perfeição.
Muito por conta do penúltimo episódio, quando houve a esperada batalha em King´s Landing, resolvi adiantar algumas análises que só faria após o final da série. Diante dos inúmeros debates e críticas, achei que poderia ser interessante para refletir sobre como a história chega ao capítulo derradeiro. Abaixo, listo seis escolhas criativas do roteiro que estão difíceis de aceitar sobre a série:

MOMENTOS DIFÍCEIS DE ENGOLIR EM "GAME OF THRONES"

- A apressada mudança de personalidade de Daenerys

As discussões sobre a personalidade de Daenerys Targaryen (Emilia Clarke) ganharam força no início da última temporada, mas repercutiram mais a partir do ataque impiedoso da Mãe dos Dragões a King´s Landing, depois que os exércitos de Cersei (Lena Headey) já tinham se rendido e o povo estava acoado pela força dela. Concordo com quem diz que os sinais de que Daenerys revelaria uma nova face estavam presentes antes, mas não concordo com quem defende a apresentação disso agora. Nas sete temporadas anteriores, atitudes e conversas da personagem indicavam isso, mas sempre como detalhes ou cenas pontuais. Não houve uma progressão, uma escalada para a predominância desse traço de personalidade, que a fez começar a ser comparada com o pai, o Rei Louco. A oitava temporada, no entanto, impôs mudanças rápidas demais que passaram a soar incoerentes com a rainha que busca liberdade e justiça para si e para o povo. De novo: o problema não é o arco da personagem, mas o ritmo imposto a ele. Daí surge, por exemplo, o desconforto sobre a escolha de Daenerys em não poupar King´s Landing. Não parece coerente, porque não foi uma construção sólida vista ao longo do tempo.

- O fim do Rei da Noite

Foi boa a idea de Arya Stark (Maisie Williams) ser a responsável pela destruição do temido Rei da Noite, mas, convenhamos, a maior ameaça a Westeros e ao mundo dos homens foi exterminada rápido demais, não? Como muitas tramas em "Game of Thrones", a trajetória dos White Walkers e do Rei da Noite foi construída lentamente ao longo da série, com essa ameaça ganhando importância a medida em que a história se encaminhava para um desfecho. O Rei da Noite foi encarado como o grande mal que chegou aos Sete Reinos, capaz de criar uma noite eterna e transformar todos em membros de seu exército. Ninguém pode negar que Jon Snow (Kit Harrington) e companhia não sofreram para deter os White Walkers e, se não fosse por Arya, teriam perdido o combate. Mas, comparativamente, a derrota do vilão foi rápida, levando em conta outros inimigos que continuavam vivos até depois da grande batalha em Winterfell. Essa sensação pode ser explicada porque havia muitas dúvidas sobre a figura do Rei da Noite, que foi eliminado sem que mistérios sobre a origem e os desejos dele fossem esclarecidos.

- A morte de Cersei

Cersei Lannister despertou o ódio dos espectadores de "Game of Thrones" ao longo dos episódios. Por isso, muitos esperavam que a personagem teria um desfecho grandioso, uma morte que servisse como castigo por todas as traições e crueldades cometidas na trama. Na batalha final em King´s Landing, no entanto, Cersei observou a tudo acoada na Fortaleza Vermelha para, depois, morrer acompanhada do irmão Jaime (Nikolaj Coster-Waldau), que abandonou os novos aliados para tentar salvar a irmã e o filho que ela esperava. O desfecho da personagem, no entanto, foi bem morno. Até dá para entender que os roteiristas quiseram criar um beco sem saída para a mulher que dizia sempre fazer tudo em nome dos filhos, mas foi um final sem força e que desvalorizou a trajetória de Cersei. Tem gente por aí dizendo que ela não morreu e vai aparecer no episódio final, mas, se isso acontecer, vai ser pior do que o aparente destino reservado a ela. Por favor, roteiristas, não façam isso!

- Arya desiste da vingança

A corajosa garota Stark passou por muitas situações-limite para se vingar de todos os responsáveis pela queda da família dela, mas abriu mão disso com o principal nome da lista de vítimas. Arya sobreviveu a perigos enormes e aprendeu as técnicas dos Homens Sem Rosto para se tornar uma assassina profissional. Por mais que houvesse discussões sobre isso, não havia ninguém capaz de tirar da cabeça da personagem a ideia de vingança contra Cersei. Perto de concretizar isso, um diálogo rápido com Sandor Clegane (Rory McCann) fez a garota mudar rapidamente de ideia. É claro que não sou defensor de vinganças, mas essa mudança transformou uma trama construída ao longo de tanto tempo em pó. Não houve uma grande motivação ou percepção sobre o equívoco da ideia, apenas um recurso para tirar a personagem de um ambiente e colocá-la em outro na grande batalha. Não colou!

- A importância reduzida de Tyrion

Mostrado, no início, como rebelde e frustrado pela forma como as pessoas o tratavam, Tyrion Lannister (Peter Dinklage) foi sobrevivendo aos inúmeros acontecimentos da série por conta da evidente inteligência. Isso fez, inclusive, com que ele conquistasse a confiança dos aliados e virasse a Mão de Danerys, responsável por elaborar as estratégias de combate da Mãe dos Dragões. Pois é, pelo visto, toda essa inteligência acabou. Cometendo erros definitivos na trama, Tyrion foi criando desconfiança na aliada e, como se não bastasse, isso ameaçou a sobrevivência dele. Desde que assumiu essa função na série, o anão Lannister passou a perder importância na história e, na oitava temporada, virou um mero "leva e traz" e observador dos excessos de Daenerys. É melhor o personagem voltar a usar o cérebro, isso se quiser sobreviver no final.

- Bran é o Corvo de Três Olhos... e daí?

Bran Stark (Isaac Hempstead Wright) foi inserido em uma das tramas mais enigmáticas e místicas de "Game of Thrones". Depois de ter perdido o movimento das pernas, o garoto embarcou em uma jornada, como não poderia deixar de ser, de sobrevivência e descoberta. Muitas pessoas perderam a vida para garantir que Bran, o Corvo de Três Olhos, capaz de ver o futuro, atingisse seus objetivos. Por isso, cabe a pergunta: e daí? Não é possível que a função do dom de Bran na trama seja única e exclusivamente a de revelar que Jon Snow é, na verdade, Aegon Targaryen, herdeiro legítimo do trono de Westeros. Seria muito pouco para justificar o arco do personagem e todos os mistérios deixados em aberto por essa trajetória. Vejamos se isso vai ser corrigido no episódio final.

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