"Além do Tempo" acerta com história bem contada e deixa caminho próspero para nova fase

Divulgação/TV Globo
O enredo não chega a ser nenhuma novidade: almas, que já viveram amores e conflitos em vidas passadas, se encontram novamente para resgates e resoluções de pendências. Elizabeth Jhin não é a primeira autora a abordar a reencarnação em uma telenovela. Não é nem mesmo a primeira vez que a própria fala sobre o tema, já retratado em "Escrito Nas Estrelas" e "Amor Eterno Amor", outros dos seus folhetins do horário das seis. Mas, com "Além do Tempo", trama que atualmente ocupa a faixa da TV Globo, a autora acerta em cheio ao apresentar bons personagens e uma trama bem amarrada, mesmo ela não sendo uma grande inovação do gênero.
"Além do Tempo" é uma história contada em duas fases. A primeira, que terminou na semana passada e durou pouco mais de 80 capítulos, os personagens vivem no século XIX, no sul do Brasil. Na cidade de Campobello, vive a condessa Vitória (Irene Ravache), uma mulher amarga e ressentida, que carrega o trauma de ter perdido o filho Bernardo (Bernardo Marinho) em um acidente. O que ela esconde é que a tragédia foi causada por ela, com o intuito de matar a namorada do filho. Anos depois, a condessa reencontra Emília (Ana Beatriz Nogueira) e o ódio entre as duas ressurge.
Na região para vender sua propriedade, Vitória ainda nutria esperanças de que o filho tivesse sobrevivido ao acidente. Para tentar localizá-lo, a condessa conta com a ajuda do capataz Bento (Luiz Carlos Vasconcelos) e da governanta Zilda (Nívea Maria), que guardam o segredo da patroa. Paralelo a isso, Emília passa a receber sinais de que Bernardo (Felipe Camargo) está vivo e inicia a procura pelo amado. Para manter Vitória longe de sua família, ela decide manter a filha Lívia (Alinne Moraes) em um convento e esconde que a jovem é fruto de seu relacionamento com o filho da condessa.
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Em sua ida à Campobello, Vitória tem a companhia do sobrinho adotivo Felipe (Rafael Cardoso), que estava de noivado marcado com Melissa (Paolla Oliveira), a esperança da mãe Dorotéia (Julia Lemmertz) e do irmão Roberto (Rômulo Estrela) para tirar a família da miséria. Só que Felipe acaba se apaixonando por Lívia, aproximando, sem saber, a personagem de suas origens. Na conclusão dessa primeira fase, já decididos a ficar juntos, Felipe e Lívia acabam surpreendidos por uma armadilha de Melissa e Pedro (Emilio Dantas), que era apaixonado pela protagonista. Melissa acaba empurrando Lívia de um penhasco e, depois, é morta por Pedro. Tentando salvar a amada, Felipe segura Lívia, mas é atingido por um florete empunhado por Pedro, que acaba sendo responsável pela morte do casal.
Depois do desfecho, a novela dá um salto no tempo de cerca de 150 anos e, já nos dias atuais, passa a mostrar o encontro de todas as almas que viveram em Campobello na época. Na vida moderna, Lívia e Felipe se encontram em um metrô e ficam com a sensação de já se conhecerem. O encontro dos dois, no entanto, não é possível naquele momento por conta da interferência do anjo Ariel (Michel Melamed), que acompanhou a trajetória do casal na vida passada e está convencido de que o amor só faz as pessoas sofrerem. 
Especialista em vinhos, Lívia passa a intermediar a compra de uma vinícola no Sul pela empresa de sua mãe Emília, agora uma rica e amarga empresária, atormentada por um acontecimentos do passado que envolvem Vitória, sua mãe nesta nova vida. Ao visitar sua nova aquisição, Lívia acaba reencontrando Felipe e tem novamente a sensação de o conhecer. Só que a história ainda não pode ter o final feliz, porque ele volta casado com Melissa, que agora aparenta ser uma mãe exemplar e mulher devotada. 
"Além do Tempo" trouxe de volta ao horário um folhetim clássico, centrado em uma história de amor tradicional e personagens maniqueístas e carismáticos. Por não inovar nesses aspectos, a autora concentrou seus esforços em contar bem o enredo, com situações dramáticas acentuadas e tramas bem amarradas. O sucesso da empreitada, comprovado na primeira fase da novela, só mostra que a inovação nem sempre precisa vir atrelada à história, mas pode aparecer no modo de contá-la.
Divulgação/TV Globo
A grande novidade do folhetim foi apostar em um formato diferente de abordar o tema. Ao apresentar uma primeira fase em 80 capítulos, Elizabeth Jhin, na verdade, cria "duas novelas", mas começa a segunda delas com a vantagem de já contar com a torcida do público pelos personagens, mesmo que algumas histórias tenham mudado um pouco. A empreitada, no entanto, pode ser uma faca de dois gumes, já que o espectador também pode não responder tão positivamente à nova fase da trama, por já estar habituado ao estilo de época impresso no começo. O balanço disso só poderá ser feito perto do fim do folhetim.
Também é importante destacar o trabalho muito bom do elenco, com destaque para o desempenho irretocável de Irene Ravache e Ana Beatriz Nogueira. A fotografia e a direção de Rogério Gomes proporcionam imagens belíssimas ao folhetim.
Tradicional e bem amarrada, "Além do Tempo" deixou a ousadia para o modo que a autora escolheu para contar a história. Isso prova que a forma da narrativa pode ser um diferencial para os chamados clichês dramatúrgicos, que têm seus valores e não devem ser menosprezados. Um "clichê" não precisa vir com uma conotação negativa e, se bem contado, pode render bons produtos e divertimento para o público que, algumas vezes, se comporta como uma criança: quer ouvir a mesma história, contada de uma maneira diferente. Espero que a segunda fase, uma "nova" novela, consiga preservar todas as qualidades vistas até aqui.

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